Quando eu era pequena não pensava em pé de princesa, mas sim no de mainha. Pequeninin, branquin, uns dedin que ficavam com as pontas vermelhas depois de retiradas as cutículas. Um esmalte branco, num pézin branco, cheiroso, limpinho, tamanho 35.
Amei o pé de mainha a vida toda e queria muito um igual, ou dois, se possível. Eu ficava muito triste de não ter um pézin branquin limpin igual ao dela. Um dia, ainda criança, tirei as cutículas, passei o esmalte e alguma coisa ainda parecia suja. Não ficou igual. Mas eu também nunca tive um pézin branquin e isso não sai no banho.
Hoje, no ônibus, vi um pézin branquin numa sandália de tiras azuis e brancas. Lembrei de mainha na hora. Fiquei olhando, relutei pra ver o rosto da dona daqueles pés. Vai que não era mainha. E nem poderia ser. Mas, e se fosse? Eu não queria olhar. Porque se fossem de mainha… Não só um, mas dois pézin branquin, limpin, às sete da manhã num busão em São Paulo. Eu sozinha. Uns pézin branquin e eu com saudade de mainha. Eu não ia aguentar o percurso inteiro sem saber se era ela ou não.
De longe não dava para sentir o cheiro, mas se desse… E se fosse mainha cheirando a café com floratta in blue às sete da manhã? O pior é que, se fosse, ela tinha saído de casa sem nem me dar um beijo. E aquele que era o cheiro do beijo dela de manhã. Eu não ia aguentar. Rezei pra não ser mainha, eu nem queria mais. Mainha ali, em São Paulo, às sete da manhã tomando um rumo diferente do de minha casa.
Olhei pra dona. Não tinha nada a ver. Desculpa, mainha. Tinha algo nos pézin que tirava toda a perfeição. Quase deixei um pézin no ônibus me matar de saudade às sete da manhã.
Mainha, entenda, comprei do seu biscoito, fiz do seu chá e, ainda assim, não te vi no final do dia. Dois pézin branquin na rua foi a gota d’água.
— H. Conrado
Onde envio o boleto pra você pagar a minha terapia? Brasil, estou devastada.