É. Pois é. Se eu for contar todas as vezes que olhei para o sol pensando em me queimar… Já pensou? Já parou pra pensar, Júlio? Não estou falando de bronzeamento. Estou falando de me queimar, tipo Ícaro, mas sem asas — se eu as tivesse não pensaria nisso, é claro. Imagina só se eu faria isso se eu tivesse essas coisas que não tenho.
Mas você acha mesmo que Ícaro não sabia? Ele sabia, Júlio, e por isso foi tão alto. Ele queria cair. Mas tudo bem, né. Já é quarta-feira, dá pra segurar. Se fosse segunda, aí sim… Difícil. Mas já é quarta, ainda bem.
Eu não acho que tem passado rápido como parece, Júlio. Todo dia tem parecido anos e todo ano tem parecido dias. Minha mãe diria que é coisa do fim do mundo, lago de enxofre, essas coisas. Mas se for, paciência também, né, Júlio, a gente tem aguentado tanto até a sexta-feira. Deus me perdoe, mas é isso, não vou mentir. A gente tem aguentado tanto. Por isso não gosto dessa conversa de vida eterna, já te falei… Parece coisa de quem não aguenta até sexta e aí quer resolver a segunda-feira pra sempre.
Deus me livre. Sábado a gente se espreguiça na cama, come pão com manteiga ou Coca-Cola no café da manhã, vai depender da noite anterior. É, Júlio, eu também não me lembro da última vez que chapei na sexta, então vamos combinar que seria mesmo um pão com manteiga no sábado de manhã. Vamos ser honestos.
Segunda de manhã também é boa com pão, não vou mentir. Aí também querer tudo da segunda é uma injustiça, porque do domingo geralmente a gente não quer nada, só que ele acabe, porque às vezes o final da tarde fica angustiante, aquelas coisas. É. To falando. Mas pelo menos já é quarta-feira, né. Foca nisso. Eu? Eu to focada, né, por isso o sol tá parecendo longe demais para chegar tão perto hoje. Deixa pra segunda que vem.
— H. Conrado